quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

teoria da conspiração 1

“Uns suponhamos”

Existe um texto de Bertolt Brecht em que o enredo gira à volta do petróleo. Uma peça de teatro. “A Excepção e a Regra”.

Essa é história de uma viagem, que vai discorrendo até que existe um acto fatal com consequências “naturais” e em que se percebe que o sujeito que é explorado tem menos consciência disso que o seu próprio patrão e de que a justiça pode ser (não o é quase sempre?) uma justiça de classe.

Esta é uma das várias peças de teatro que o autor considerou “didácticas” e que tinham como função, através de casos exemplares, questionar o poder e os seus mecanismos numa perspectiva colectiva, que no caso de “A Excepção e a Regra” poderíamos definir como o problematizar da “consciência de classe”

Como grande escritor que é, a simplicidade da trama da obra é aparente. Para tal o autor propõe que achemos estranho àquilo que nos parece natural, que o que nos acalma desinquiete, que em lugar da certeza prefiramos a dúvida. Tudo isto para que nada possa parecer imutável. Até aqui tudo “simples”, mas a dado passo o texto inquieta ainda mais com um diálogo que estabelece entre o personagem que faz de Carregador e o de Guia da expedição.

O Carregador pergunta, na sua ingenuidade, o que fará o seu patrão e aqueles a quem serve depois de acharem o petróleo? Ao que o Guia responde: depois de encontrados os poços enterram-nos de novo. Não é o petróleo que o chefe da expedição quer. Quer é o dinheiro para se calar.

Esta tirada “enigmática” ilustra a que ponto pode ser ardiloso o pensamento com que se rege o mecanismo económico actual e a complexidade da questão apresentada.

Com isto, falo para aqueles que não partilham da ideia de que a guerra do Golfo foi forjada por causa do potencial das reservas de crude naquela região, mas falo, sobretudo, para os outros, quer os de esquerda, ou mesmo de direita, ou de centro, que já estabeleceram uma relação entre a guerra do Iraque e o controlo das fontes principais do petróleo no mundo, e a conquista do pico petrolífero (1), de entre essa imensa maioria ainda não vi o problema colocado nos moldes com que Brecht aborda o problema e que explicam em parte um outro lado da nossa irrealidade quotidiana.

Numa altura em que as corporações ligadas à industria petrolífera obtêm lucros fabulosos, devido, em grande parte, à sua própria “incapacidade” de refinar os derivados do petróleo necessários para corresponder à sua procura, temos de dar mais atenção ao que Brecht nos propõe e pensar que esta não pode ser uma invasão “natural”: um choque de civilizações, a democracia contra a barbárie, as pessoas civilizadas contra os terroristas, o mundo cristão contra o oriente islâmico.




Então que tipo de invasão é esta? Para além de querer, à força, implantar o modelo económico ocidental? Ou talvez por isso mesmo! Não terá sido ela pensada logo de início em transformar de propósito toda aquela terra num pântano?

A luta de gigantes entre as corporações petrolíferas e as suas alianças com o complexo militar/industrial, resultou numa ocupação do território ilimitada no tempo, que inclusivamente fez com que as diferenças de credos e culturas desembocasse numa guerra civil, um dos factores que mais destabiliza um país ou uma região.

Apesar do esmagador domínio das empresas ligadas aos sectores de poder que controlam o governo dos EUA, ainda hoje se digladiam processos judiciais entre várias corporações pelo controlo da exploração do petróleo e da reconstrução do país. A guerra contra o terrorismo tem então de continuar. Quem morre, já diz o rifão, é carne para canhão.

Todos conhecemos, o caso da flagrante manipulação de interesses que estiveram por detrás da guerra civil em Angola, de recente memória, e que tinha também por base o domínio das riquezas do solo angolano. Quem ganhou a batalha, a da guerra e a da economia, foram os que agora legalmente exploram essas riquezas. Um pântano que durou décadas a drenar, escusado será dizer, neste tempo globalizado, sempre em desfavor do povo que delas está absolutamente necessitado.

Não é este o mesmo modo de actuar, de quem também quer que o petróleo do médio oriente só escorra a conta gotas, para que mais adiante essa região do mundo constitua uma grande reserva maciça de crude, explorado pelas corporações que ganharem a batalha jurídica, onde o réu, como no caso de Angola, Nigéria e por aí fora, é o povo?

Acontece por vezes, que parece inclusivamente, que deus protege estes planos – a ortodoxia religiosa encontra-se justificada – e com o Katrina, que para cúmulo arrasou a parte negra e pobre de Nova Orleans, estava dado o mote para nova especulação petrolífera, agora com o argumento que as plataformas naquela área estão danificadas, quando todos os interessados sabem que foram essas instalações que melhor resistiram à intempérie.

Uma crise na Coreia ali, uma palavra de Bin Laden de acolá, de Sadam do além, Chaves diz basta já! E eis como, com o medo de que se feche um pouco mais a torneira da fonte, se aumenta o preço do produto refinado.

Assim, por enquanto, o que vemos é o convívio pacífico dentro do mercado na subida dos preços, nos lucros fabulosos e impensáveis das corporações ligadas à exploração e refinação do petróleo e da indústria das armas (3)– e todas ganham com manter este status quo enquanto nada se resolver. Não é estranho? Não nos devia inquietar? É a lei do mercado! E ele não foi sempre por demais condicionado? Então e o medo induzido? (3)

Aqui há alguns anos o choque petrolífero atingiu a sociedade ocidental com a diminuição do abastecimento por parte dos grandes produtores que por um motivo ou mais do que um, estavam em desacordo com as potências ocidentais e da sua ânsia hegemónica de dominar o mundo e com a famigerada criação do estado de Israel.

Na actualidade essa hegemonia faz-se sentir através já não dos estados, meros instrumentos bélicos – e já nem isso com a chamada privatização da guerra (nunca os mercenários foram tantos) – mas das corporações que se dedicam a explorar os antigos produtores reivindicativos, com argumentos bélicos, económicos e “naturais”

Essas corporações com “PIB(s)” maiores que muitos estados do mundo, aperceberam-se da fragilidade das suas posições e actuaram. Ou directamente através das armas do Estado ou rodeando a questão financiando muitas e várias ONG que, por detrás da aparente caridade prestada, se limitavam a organizar a divisão, a fomentar a discórdia, a alimentar tiranos, inventar mujahedins e todo um arsenal de esquemas ardilosos, para que qualquer unidade anteriormente alcançada esteja fora de causa. Fechar umas torneiras porque se quer é uma coisa, porque outrem o queira é que não pode ser! Já se sabe!

Reduzir a vontade dos povos dessa parcela da Terra pelo terror de estado ou da al Qaeda, impondo-lhes como caudilhos, emires, reis e reizetes, tiranos e tiranetes, à força ou “democraticamente”, encaminhando-os à condição de dóceis clientes duma sociedade mirífica onde em doses razoáveis sejam protagonistas da propaganda de “Hollywood”, para melhor e por mais tempo se assenhorearem das reservas dessa fonte de energia fóssil que alimenta os bicos do nosso fogão.

Por enquanto...

(1) Quando à questão do pico petrolífero, nada detalhada neste post, por favor consultem: F. William Engdahl, autor de a Century of War: Anglo-american Oil Politics and the New World Order, Pluto Press ltd. contacto: www.engdahl.oilgeopolitics.net . O texto a que me refiro encontra-se em http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=6880
(2) Jornal “O Público” ed. Sexta 10 Agosto de 2007, suplemento de Economia, pág 8 “Acções das empresas de Guerra estão em alta”.
(3) Esta questão do medo merece, futuramente, um post só a ela dedicado.

2 comentários:

Anónimo disse...

Saravá FJ!
Isto começa a ficar composto

Anónimo disse...

Os EUA têm neste momento um poder que nunca antes na história nenhum império teve. Graças ao fim da URSS, podem impor a sua vontade quase de forma indiscriminada. Unicamente a China e a Rússia têm capacidade para se opor “levemente” ao seu poderio.

Esse poder dos EUA em última instância advém-lhe do domínio da energia, os seus estrategas fazem “planos para dez mil anos” e nesse sentido é necessário assegurar as reservas de petróleo nestes próximos dez mil anos.
No entanto eles têm consciência que o petróleo mais tarde ou mais cedo acaba. É uma matéria prima não renovável e a crescer o seu consumo ao ritmo a que está a ser feito, rapidamente se esgota, só a China e a Índia estão num ritmo de aceleramento do seu consumo que não augura nada de bom para o preço da gasolina para os nossos carrinhos.

Por isso, a razão porque os EUA querem dominar aquela zona, não tem nada de misterioso, é clara como a água, é o controle do petróleo, da energia, factor fundamental à manutenção do seu poder, durante o máximo de tempo possível.

A propósito deste tema ver este post do “Zero em conduta”: http://zerodeconduta.blogspot.com/2007/12/guerra-do-iraque-explicada-em-3.html