quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Histórias da imprensa livre

A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) admitiu ontem que a "reconstituição provisória" divulgada no site da ERC e publicada em Setembro pelo jornal Expresso, relativa a uma audição realizada em Abril de 2007 ao director do PÚBLICO, José Manuel Fernandes (JMF), sobre alegadas pressões do Governo, não é afinal a versão definitiva dessas declarações. Trata-se, na verdade, de uma primeira versão construída a partir de notas recolhidas pelos membros do conselho regulador durante a audição e que foi divulgada devido ao "erro de um funcionário".

Em causa está o facto de as declarações prestadas por JMF não terem sido gravadas pelo sistema de som da ERC, ao contrário do que sucedeu com os restantes responsáveis ouvidos na mesma altura, no âmbito de um inquérito da entidade sobre alegadas pressões para abafar a investigação jornalística relativa à licenciatura do primeiro-ministro.

"Não nos lembrámos de ligar o gravador ou o sistema avariou", justificou ontem ao PÚBLICO o presidente da entidade, Azeredo Lopes, indicando que só se deram conta disso após a audição. "De imediato, entrámos em contacto a pedir imensas desculpas" pelo facto de as declarações não terem ficado gravadas, disse. "Combinei que enviaria, com base em notas muito dispersas da audição, aquilo que parecia a reconstituição provisória e JMF devolveu o documento uns dias mais tarde com correcções", acrescentou Azeredo Lopes. "Tenho de dizer que a versão definitiva da audição é a versão corrigida pelo director do PÚBLICO", assumiu também: "A culpa desse erro é da própria ERC". Em causa está a divulgação da audição de JMF à ERC e das declarações deste sobre uma conversa telefónica mantida com o primeiro-ministro.

"(O primeiro-ministro) fez uma referência subtil ao facto de ter estabelecido uma boa relação com o Eng. Paulo de Azevedo [presidente da Sonaecom, proprietária do PÚBLICO] durante a OPA [à Portugal Telecom], o que queria dizer: fiquei com uma boa relação com o seu accionista e vamos ver se isso não se altera", cita o documento originalmente divulgado pela ERC. "É uma interpretação subliminar dizer que sempre existiu uma boa relação com o accionista (e admitir que ela poderia ser posta em causa?) ", lê-se ainda na versão provisória do documento.

Já a versão definitiva, só ontem divulgada no site, é diferente: "O PM fez então uma referência ao facto de ter estabelecido uma boa relação com o Eng. Paulo de Azevedo durante o período que durou a OPA, o que me levou a reflectir sobre o sentido daquela referência e se nela havia alguma mensagem, pois não me pareceu vir a propósito".

Não deixa de ser curioso nesta história a oportunidade da avaria ou esquecimento em ligar o gravador, assim como o hipotético recuo nas declarações de JMF, é que parecendo que não o Eng. Paulo Azevedo continua a ser presidente da Sonaecom, proprietária do PÚBLICO.

Não deixa de ser curioso também que a culpa deste imbróglio acabe por ser de um funcionário.

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